sexta-feira, 29 de maio de 2009

Mulher (em definição)


Mulher-Poesia
que deixa no meu corpo bocados de poema
Mulher-Criança
que desce à minha infancia
e me traz adulta
Mulher-Inteira
repartida no meu ser
Mulher-Absoluta
fonte da minha origem

Manuela Amaral

terça-feira, 26 de maio de 2009

Insaciedade



A minha fome é de dentro
e a minha sede é palavra
Manuela Amaral

sábado, 23 de maio de 2009

DO RITMO AO SEXO



Nasci das raízes do teu corpo
do ritmo acelerado do teu sexo
Nasci dos teus gestos de mulher
e desenhei-me em noite.

Manuela Amaral

DESAFIO À MEDIOCRIDADE



Chamem-me
devassa
louca
ou depravada

A vida
não é nada

É preciso
ser tudo
num instante

Manuela Amaral
Poetisa portuguesa

sábado, 9 de maio de 2009

Cessa de Correr!



Se não cessas de correr, marulhando no ar tépido com as tuas mãos como natatórios, olhando furtivamente tudo diante de que passas no meio-sono apressado, acontecer-te-á também um dia deixar passar diante de ti o carro. Se te mantiveres firme, pelo contrário, com o poder do teu olhar fazendo crescer as raízes em profundidade e em comprimento - nada então te poderá eliminar - em virtude não das raízes mas da força do teu olhar que escruta - será então que verás o longínquo imutavelmente obscuro de onde nada pode surgir a não ser precisamente uma vez este carro que rola para ti, que se aproxima, cada vez maior e que, no próprio instante em que entras em tua casa, enche o mundo enquanto mergulhas nele como uma criança no banco acolchoado de uma diligência que corre através da tempestade e da noite.

Franz Kafka, in "Meditações"
Imagem - Salvador Dalí

Do Inquieto Oceano da Multidão



Do inquieto oceano da multidão
veio a mim uma gota gentilmente
suspirando:

— Eu te amo, há longo tempo
fiz uma extensa caminhada apenas
para te olhar, tocar-te,
pois não podia morrer
sem te olhar uma vez antes,
com o meu temor de perder-te depois.

— Agora nos encontramos e olhamos,
estamos salvos,
retorna em paz ao oceano, meu amor,
também sou parte do oceano, meu amor,
não estamos assim tão separados,
olha a imensa curvatura,
a coesão de tudo tão perfeito!
Quanto a mim e a ti,
separa-nos o mar irresistível
levando-nos algum tempo afastados,
embora não possa afastar-nos sempre:
não fiques impaciente — um breve espaço
e fica certa de que eu saúdo o ar,
a terra e o oceano,
todos os dias ao pôr-do-sol
por tua amada causa, meu amor.

Ó HÍMEN! Ó HIMENEU!

O hímen! O himeneu!
Por que, me atormentas assim?
Por que, me provocas só
durante um breve momento?
Por que é que não continuas?
Por que, perdes logo a força?
Será porque, se durasses
além do breve momento,
logo me matarias
com certeza?

Walt Whitman, in "Leaves of Grass"

sexta-feira, 8 de maio de 2009

DESENCONTRÁRIOS



Mandei a palavra rimar,
ela não me obedeceu.
Falou em mar, em céu, em rosa,
em grego, em silêncio, em prosa.
Parecia fora de si,
a sílaba silenciosa.

Mandei a frase sonhar,
e ela se foi num labirinto.
Fazer poesia, eu sinto, apenas isso.
Dar ordens a um exército,
para conquistar um império extinto.

Paulo Leminski